Publicado na versão eletrônica no sítio do JB On Line (http:\\www.jbonline.com.br), bem como na versão impressa no Jornal do Brasil, caderno Economia & Negócios, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 17 de junho de 2007.
O final tanto melancólico quanto desairoso da última reunião do G-8, da qual participaram membros do chamado G-5, poderia levar à conclusão precipitada de que a principal contradição mundial do momento é existente entre os dois agrupamentos, o que somente é uma verdade parcial, por dois motivos. O primeiro é que a Rússia é uma parte estranha ao perfil dominante no G-8. O segundo motivo é que o G-8 encerra alguns conflitos menores de ordem interna.
De fato, membros do chamado Grupo dos 8, que reúne os Estados Unidos, Itália, França, Reino Unido, Canadá, Alemanha, Japão e Rússia, têm entre si confrontos potencialmente muito graves, que podem repercutir negativamente na ordem mundial. Os Estados Unidos, por exemplo, acabaram de reacender a chama de uma potencialmente nova guerra fria, ao violar os tratados internacionais de regência sobre controle de armamentos, ao pretender colocar instalações balísticas militares no leste europeu, posicionando-se para um eventual conflito com a Rússia.
Essa última, denunciada pelos Estados Unidos e por seu Estado cliente, o Reino Unido, pelo déficit democrático, responde com acusações de imperialismo e de crimes contra a Humanidade praticados por dirigentes dos primeiros, inter alia em função da campanha do Iraque. Mais ainda, os Estados Unidos vedam a acessão da Rússia à OMC, uma discriminação odiosa pelas onerosas conseqüências jurídicas, enquanto esta última nação, por seu presidente, denuncia o caráter arcaico, não democrático e inflexível, do organismo multilateral.
Alemanha e Itália têm visões antagônicas da reforma do Conselho de Segurança da ONU. Enquanto a primeira deseja um assento permanente, a segunda é contrária e propõe assentos rotativos por região. O Canadá tem o maior número de disputas comerciais contra os Estados Unidos, no âmbito da OMC, e acaba de anunciar mais uma, contra os escandalosos subsídios agrícolas. A França, sob um governo conservador, anunciou discordar da liberalização do comércio agrícola mundial, pretendendo manter o regime atual, causador de profunda miséria entre os países em desenvolvimento e uma corrupção da ordem jurídica mundial, contra o que se opõe o governo soi-disant trabalhista britânico.
Do lado do chamado G-5, composto por Brasil, África do Sul, China, Índia e México, identifica-se uma real identidade de muitos importantes pontos de política externa, como também com a Rússia, por serem todos vítimas de uma ordem internacional iníqua, a privilegiar a prosperidade de uns poucos países desenvolvidos, em detrimento dos países em desenvolvimento. Ressalve-se uma visão distinta entre Brasil e México no tocante à reforma do Conselho de Segurança da ONU, que neste caso específico pode muito bem ser resolvida com criatividade e esforço diplomático.
Assim, o que chama a atenção à primeira vista é a própria participação da Rússia no G-8. Como país em desenvolvimento e sob a ameaça, tanto militar quanto de desestabilização política interna e marginalização externa induzida, pareceria muito mais adequada sua participação num G-5 expandido. Por outro lado, a arrogância renovada dos auto-proclamados líderes do império, e de seus trôpegos clientes, ao anunciar um apócrifo comunicado conjunto que não refletia a posição dos membros do G-5, leva-nos a questionar a oportunidade política e legitimidade jurídica de reuniões entre os dois agrupamentos.
A questão apresenta-se com matizes de maior gravidade porque o comunicado falso implicava claramente na concordância em posições que impactariam de maneira adversa a capacidade de adoção de políticas públicas relacionadas ao desenvolvimento econômico e social. A continuidade das tentativas de exercício de relações públicas das chamadas reuniões conjuntas entre o G-8 e o G-5 não apresentará apenas resultados anódinos, pois tirará a legitimidade dos organismos multilaterais criados pela ordem jurídica internacional, como a ONU, foro apropriado para negociação dos interesses soberanos.