Análise pioneira da nova Constituição de Cuba

Resenha publicada no sítio eletrônico Grabois, São Paulo, 03 de março de 2020.

O autor é formado pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e é pós-graduado em Direito Constitucional pela Hastings College of Law (Universidade da Califórnia), em São Francisco, nos EUA. É sócio sênior, fundador e presidente do Comitê Executivo de Noronha Advogados, com sede na cidade de São Paulo e outros escritórios próprios em Rio de Janeiro, Lisboa, Miami, Buenos Aires, Londres e Pequim.

Membro da Ordem dos Advogados do Brasil, da Law Society of England and Wales na Inglaterra e Gales e da Ordem dos Advogados Portugueses, Noronha é árbitro da Comissão Internacional de Arbitragem Comercial da China (CIETAC) e da South China International Arbitration Commision. Foi árbitro da Organização Mundial do Comércio

O intelectual compara aspectos da Constituição cubana com aquelas da China, da Rússia, de Portugal, da Itália e do Brasil.

A obra

A partir de uma síntese da história de Cuba, antes e depois do triunfo revolucionário de 1959, ele expõe os principais conteúdos por capítulos da Carta Magna cubana aprovada no referendo em fevereiro do ano passado, em meio ao bloqueio norte-americano que afeta o país.

Destaca o processo participativo da população nas propostas para o projeto apresentado, e ressalta a importância do preâmbulo, que, diferentemente de outras constituições, são contextualizadas as aspirações que a sociedade se propõe e seus valores fundamentais, como a solidariedade.

A nova Constituição cubana foi proclamada pela Assembleia Nacional do Poder Popular em abril do ano passado, depois de passar pelo crivo de uma consulta popular, da qual participaram mais de seis milhões de eleitores.

Segundo o presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, a nova Carta Magna reafirma o caminho que o país percorre desde a Revolução de 1º de janeiro de 1959.

A nova Constituição, que substitui a de 1976, tem como objetivo atualizar o modelo econômico e social do país, nos marcos do sistema socialista.

Em discurso no evento da proclamação, o ex-presidente Raúl Castro disse que a nova Constituição “salvaguarda os pilares da nação, a igualdade e a independência da Pátria”. Para ele, com o novo texto, o Estado revolucionário e socialista da ilha foi institucionalizado e fortalecido.

O prefácio

O prefácio “Cuba: Histórica Jornada Democrática de 2005 a 2019”, o presidente da Fundação Maurício Graboise e ex-presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, destaca que trabalho analítico apresenta uma conclusão sobre a promulgação da Constituição cubana de 2019, realçando o feito como um “extraordinário marco democrático”. “A nova Constituição traduz, como ele acentua, ‘combativo apego aos valores da liberdade, da independência, da justiça social, da solidariedade humana e consciência social’. A nova Constituição ‘é igualmente um paradigma para a promoção dos direitos humanos, individuais e sociais de uma maneira geral, para todos os povos’. É em grande medida uma resposta da nação cubana ao imperialismo, na luta incessante por sua dignidade e soberania”.

O prefaciador também enfatiza as transformações econômicas que a nação promove e institucionaliza, dentro dos marcos da construção socialista que caracteriza aquela sociedade. Para ele, o socialismo cubano revela contradições entre igualdade social e capacidade produtiva que precisam ser superadas. “O debate sobre a principalidade da tarefa econômica expõe uma visão predominante na construção socialista cubana de um idealismo igualitarista, representado pela tentativa de manter um Estado de bem-estar social sem equivalente capacidade estrutural produtiva que permitisse sua sustentação. Ademais o debate e o estudo desnudam distorções, sendo a mais saliente a que se refere ao princípio distributivo: um indivíduo que não trabalha praticamente tem as mesmas condições de quem trabalha.”

Renato cita que nas experiências contemporâneas do socialismo, os dilemas decisivos para os projetos socialistas têm hoje, nas experiências chinesas (desde 1978), vietnamita (desde 1986) e mais adiante a Cubana (desde 2005), alternativas próprias que vêm conseguindo superar os impasses estruturais, num mundo predominante de capitalismo, e dar materialidade ao socialismo na atual quadra histórica. “Essas experiências se distanciam do ‘modelo soviético’ de um período excepcional, abrindo caminho na transição socialista atual e incorporando novas estruturas e formas institucionais.”

Renato conclui o prefácio saudando a tarefa heroica da nova constituição cubana: “Em nossa época de desesperanças, é alvissareira, e se deve reconhecer, a gigantesca tarefa emancipacionista social e nacional dos países que têm atrás de si uma revolução anticolonialista e que agora se desvelam para encontrar o próprio caminho, evitando sobretudo cair numa condição de dependência (financeira, econômica e tecnológica) neocolonial.”

O evento é promovido pela Fundação Maurício Grabois, pela Casa de Portugal, pelo Consulado Geral de Cuba, pelo Observador Legal e pelo NACI (Núcleo de Análise de Conjuntura Internacional da PUC-SP).