O conceito do “LI” na filosofia de Confúcio

Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 18 de agosto de 2010.

Lisboa – Segundo Confúcio, o “LI” significa, de um lado, o princípio da decência, em conjunto com as boas maneiras que decorrem de sua aplicação social. Por outro lado, numa perspectiva filosófica, o “LI” significa uma ordem social racionalizada, de acordo com a qual tudo está em seu devido lugar. Nesse último sentido, os ritos de comportamento social são fundamentais para a inter-relação das pessoas sob o respeito da autoridade maior. Segundo Confúcio, o “LI” previne o caos moral e social da mesma maneira que um dique evita as enchentes.

Como conseqüência, o sistema do “LI” cobre toda a estrutura social, moral e religiosa da nação. Assim, o “LI” consiste num plano concreto, vasto e abrangente de hierarquia social, com intrincadas regras de inter-relacionamento pessoal a compreender não apenas a estrutura familiar, as classes sociais, os diversos níveis de governo, como também manifestações diversas como o tratamento dos idosos, a conduta dos homens e das mulheres, os funerais, os festivais culturais, etc.

Para a compreensão plena do “LI”, Confúcio pregava com muita ênfase a importância da educação do povo. “ A educação sem reflexão é um exercício estéril, ao passo que a reflexão sem educação é um exercício perigoso”, ensinava. Assim, para a inteligência efetiva do “LI”, Confúcio dava grande importância ao conhecimento preciso e adequado do vernáculo e de seu vocabulário.

O único caminho para a civilização do povo e a sedimentação social dos bons costumes é o da educação. Confúcio ensinava aos governantes a voltar sempre os seus pensamentos ao ensino. “A virtude é um produto da educação”. Uma pessoa que pautasse o seu comportamento social fora das normas do “LI” tornava-se um ser desprezível.

Conforme o ensinamento de Confúcio no Livro das Canções:

“Até um rato tem um corpo,
mas para um homem sem “LI”
é melhor estar morto.”

Como princípio de respeito mútuo, decência e cortesia, o “LI” traz piedade aos templos; justiça aos tribunais; afeição entre pais e filhos; harmonia entre irmãos; e respeito entre velhos e jovens. No governo, o “LI” mantém a autoridade e a observância do bem comum. Na diplomacia, o “LI” serve como suave mas eficaz protocolo a manter o respeito mútuo entre os representantes de Estados diversos em suas relações oficiais.

Segundo Confúcio, o regime jurídico das sanções pode, até certo ponto, levar o indivíduo a evitá-las, mas este jamais desenvolverá o sentimento da honra ou da vergonha como conseqüência daquele. Segundo o Mestre, o objetivo desejado a ser alcançado é a inexistência de ações judiciais. Aqueles que erraram devem reconhecer o erro, envergonhar-se dele e repará-lo, evitando por conseguinte o seu aviltamento numa falsa defesa ou posição perante um tribunal. Afinal, “quem não corrige um erro está a cometer um outro”.

Ao adotar o humanismo como o principal alicerce de sua filosofia, Confúcio ensinava que “ a medida do homem é o próprio homem “. Da mesma forma, dizia que “ é o homem que faz grande a verdade e não a verdade que faz o homem grande. “ O padrão do humanismo é o conceito da reciprocidade: “ não faça aos outros aquilo que não deseja que façam consigo”. “Comporte-se com os amigos como deseja que se comportem consigo”, ensinou o Mestre.