Publicado no jornal DCI – Diário Comércio Indústria & Serviços, caderno Justiça e Legislação, São Paulo, SP, Brasil, 27 de junho de 2007.
LISBOA – Foram encerrados de maneira melancólica e frustrantes, em Potsdam, os entendimentos do chamado G-4, o grupo composto de um lado pelos líderes dos países desenvolvidos, EUA e União Européia e, de outro, pelos coordenadores dos interesses dos países em desenvolvimento, Brasil e Índia, com o objetivo de salvar a Rodada Doha da OMC (Organização Mundial do Comércio).
Cada um dos lados, previsivelmente, culpou o outro pelo fracasso do encontro. Na realidade, buscavam a UE e os EUA obter, mais uma vez, a rendição dos países em desenvolvimento à sua agenda injusta e cruel, como já havia ocorrido na Rodada Uruguai da OMC, encerrada em 1994, e que resultou na criação da OMC.
Naquela ocasião, os países desenvolvidos subverteram a lógica humanística e obtiveram, segundo dados da ONU (Organização das Nações Unidas), do Bird (Banco Mundial) e do insuspeito FMI (Fundo Monetário Internacional), 80% das vantagens do sistema multilateral do comércio.
Conseguiram os países ricos inserir, segundo seus critérios e interesses exclusivos, as chamadas áreas novas de investimentos, propriedade intelectual e serviços no regime comercial, enquanto mantiveram em vigor os seus infames subsídios agrícolas que devastam as economias em desenvolvimento, responsáveis por 80% da população mundial.
Como resultado, sedimentou-se a nítida, e correta, percepção na opinião pública internacional de que a OMC é um organismo criado para promover a prosperidade seletiva de uns poucos, os países desenvolvidos, em detrimento dos muitos, os em desenvolvimento, através de regras iníquas e de uma administração corrompida por uma gestão viciada.
Com a completa desmoralização do organismo multilateral, procurou-se resgatar a iniciativa com o lançamento, em 2001, de uma nova rodada de negociações do sistema, a Rodada Doha, que deveria promover o desenvolvimento, conforme clamara a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) no chamado “Consenso de São Paulo”.
No entanto, no odioso jogo de poder mundial em que buscam a prosperidade própria a qualquer custo, os países desenvolvidos mantiveram uma agenda radical, sem concessões de qualquer espécie.
Em primeiro lugar, asseguraram a manutenção de todas as vantagens obtidas na Rodada Uruguai.
Em seguida, buscam a manutenção de seus infames subsídios agrícolas para, em terceiro lugar, demandar concessões maiores dos países em desenvolvimento na redução de tarifas industriais e de acesso a mercado em serviços.
Nesse último setor, as vendas externas dos países ricos, que já representam mais de 80% do comércio global, crescem o dobro do ritmo das dos emergentes.
De fato, a política do comércio internacional não comporta os sentimentos de pena, dó ou piedade. Assim, não tiveram os países emergentes, representados por Brasil e Índia, outra alternativa do que a de encerrar as negociações.
Foi um rompimento tardio. A agenda das negociações já era desfavorável e prenunciava um desfecho desastroso. Todavia, como diz o ditado, antes tarde do que nunca.