Trump e a queda do dólar

Publicado no jornal Diário da Região, São José do Rio Preto, SP, 18 de junho de 2025.

A agência norte-americana de classificação de riscos, Moody’s, rebaixou, em maio de 2025, a
sua avaliação sobre a capacidade de endividamento dos EUA, fundada no aumento da dívida
pública e alargamento do déficit fiscal. A medida foi adotada após Donald Trump ter lançado
uma insana guerra comercial a violar as normas das instituições multilaterais, causando maior
perda de confiança na economia daquele país. Em 2010, a agência chinesa Dagong Global
Ratings já havia relegado a avaliação creditícia dos EUA, conforme indiquei em meu livro “O
Crepúsculo do Império e a Aurora da China”, de 2012.

Em 2024, o desequilíbrio comercial dos EUA foi de US$ 918.4 bilhões, o maior já registrado.
Para financiá-lo, o Tesouro tomou emprestados US$ 2.5 bilhões por dia, para pagar uma
quantia superior, apenas em juros! Em 2004, 20 anos antes, o saldo comercial negativo
daquele país era de US$ 680 bilhões, conforme indiquei na minha coluna dominical no Jornal
do Brasil, então impresso. Esta situação faz que o insolvente país tenha que recorrer ao
endividamento, doméstico e externo.

A dívida pública dos EUA era de US$ 36 trilhões no início de 2025, ou seja 122% acima do PIB,
de US$ 29 trilhões. Contudo, cerca de 30% do montante é devido a emprestadores
estrangeiros, contra 5% em 1970. Acresce que outros 20% são devidos ao banco central,
Federal Reserve (FED), o que significa emissão de moeda. Com tal quadro, tornou-se inevitável
um sentimento de desconfiança na moeda americana, tendo as principais economias do
mundo buscado diversificar as respectivas posições de suas reservas externas.

O FMI, controlado pelos EUA, em maio de 2025, alertou o país sobre o descompasso fiscal e a
desconfiança no dólar. Em 2024, esse representava 58% das reservas soberanas globais, mas
uma década antes o montante era de 65%. Hoje, o quadro está pior. Não surpreende que, no
início do segundo trimestre deste ano, a taxa de juros paga pelo FED subiu para mais de 5%.
Verifica-se uma urgência global na proteção contra o iminente colapso do dólar. Rentistas
internacionais migram para outras moedas. Países soberanos também: no Sul Global, busca-se
alternativas monetárias para trocas, numa eventual divisa comum ou ainda escritural.

Realmente, não faz sentido algum que o comércio brasileiro com a China seja denominado em
dólares, sendo que este é o nosso principal parceiro comercial e o Brasil o seu principal
comprador na América Latina. Iniciativas comerciais recentes dos dois governos indicam um
distanciamento gradual, mas seguro, da moeda americana. Para outros países, o comércio
fundado no dólar está limitado à sua capacidade de acumulação daquela divisa, o que reduz
dramaticamente as respectivas atividades econômicas.

Não obstante, as reservas externas do Brasil, hoje em US$ 330 bilhões, são denominadas 80%
em dólares, enquanto a China tem US$ 3.2 trilhões, dos quais 60 % representados em dólares.
Este percentual continua a cair, o que alçou o Japão e o Reino Unido para a posição de
primeiros credores dos EUA. Tais países hoje ameaçam a liquidação das posições naquela
moeda, em retaliação às medidas de Trump. A debilidade da economia americana, o seu
descalabro fiscal e a sua agravada insanidade política asseguram dias difíceis para o dólar.

DURVAL DE NORONHA GOYOS JR.
Advogado (Brasil, Inglaterra e Portugal) e jurista. Árbitro internacional. Escritor e professor de
Direito do Comércio Internacional. Foi diplomata. Escreve quinzenalmente neste espaço às
quartas-feiras