Instantâneos de longa duração

Por Levi Bucalem Ferrari, publicado no sítio União Brasileira de Escritores em abril de 2012.

levi-bucalem-ferrariO bom fotógrafo procura ângulos, perspectivas, contrastes, o melhor momento para fazer a foto; usa filtros, ensaia aberturas e velocidades, combina, altera, recompõe todas estas coisas até a exaustão. Prá que tudo isso? Olha, clica e pronto!

O que os incautos não sabem é que, para além da beleza da foto, este fotógrafo tem, lá no seu íntimo, a pretensão de que ela represente todo um quadro de conceito e estética vigente no seu tempo, no seu mundo. A foto deverá ser uma síntese de muitas outras fotos e, por que não, projetar-se para a posteridade, propor-se a decifração dos sinais das mudanças e do futuro que anunciam.

Foi esta a sensação que experimentei ao ler O crepúsculo do império e a aurora da China, de Durval de Noronha Goyos Jr. (Observador Legal Editora, São Paulo, 2012). Análises conjunturais a se projetarem como instantâneos das mudanças histórico-estruturais que o mundo exibe para o analista atento e, principalmente, munido de metodologia e visão de mundo coerentes. São artigos de tamanho pequeno, publicados entre 2009 e 2011 em jornais, revistas e internet, e republicados várias vezes. Constituem-se em análises sobre questões específicas que perpassam desde as relações internacionais até aspectos singularíssimos e momentâneos da política econômica e social do Brasil, China, Estados Unidos e outros países. Mas, insisto, todos a guardarem entre si a coerência e profundidade que apontam para as grandes mudanças macro-econômicas.

Se Noronha impressiona antes por esta característica indispensável, convém acrescentar mais duas, entre outras tantas: o volume de dados e a independência do autor. Assim, nenhuma afirmação de Noronha se perde no vazio, sendo, ao contrário, comprovada por dados dispostos de forma a comprovar e ilustrar sem que o leitor se perca neles ou se canse. Não, tudo na medida certa.

Por outro lado, o autor exibe coragem e independência ímpares quando denúncia os engodos do mito neoliberal e sua permanência até entre países que retoricamente propõe-se a superar esta famigerada ideologia. Aqui se incluem alguns países europeus a colocarem por terra conquistas históricas em direitos sociais. Como também o próprio Brasil. Para combater a inflação, deixa sua moeda valorizar-se artificialmente a custa da evidente desindustrialização. Mantemos também juros altíssimos associados a um espread insano que só interessa a bancos e especuladores. Assim, o país retrocede e deixa crescer a “bolha” que pode estourar a qualquer momento com consequências sociais de grande monta. Mesmo as medidas tomadas pelo governo após a publicação deste livro – como o rebaixamento dos juros do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal – queremos crer, pareceriam a Noronha corretas, mas insuficientes.

crepusculoTodo este imbroglio tem suas entranhas destrinchadas e muito bem explicadas no livro de Noronha, o que o transformam em documento para ser lido e consultado. Por fim, o livro vem enriquecido pelo prefácio de Luiz Alberto Moniz Bandeira, Intelectual do Ano pela UBE – União Brasileira de Escritores e um dos maiores cientistas políticos contemporâneos. É ele quem afirma na contracapa do livro:

“Trata-se de um conjunto de artigos importantes e oportunos, porquanto apresenta uma lúcida percepção das mudanças na correlação mundial de forças, demonstrando a erosão que corrói o Império Americano, à beira da recessão e cuja segurança depende cada vez mais do poder militar, a um custo insustentável, em contraste com o alvorecer da China, a crescer 9,5% em 2011”… ”não obstante a profunda crise econômico e financeira na qual Estados Unidos e União Européia estão submersos.”