Texto publicado no Portal Opera Mundi em dezembro de 2011.
Qualquer pessoa que ousasse, ao fim do governo do democrata Bill Clinton, em janeiro de 2001, fazer uma previsão pessimista sobre o papel dos Estados Unidos no mundo, seria rebatido com uma sonora gargalhada. Na época, o país ainda colhia os frutos políticos e militares da vitória da Guerra Fria e do desmantelamento da União Soviética; conseguia impor a agenda neoliberal no Terceiro Mundo como uma condição obrigatória para o desenvolvimento; e contava com uma imagem positiva perante a opinião pública, que o moldava como a única superpotência existente e pronta para liderar a humanidade frente a um caminho sem retorno de progresso e prosperidade.
Os ataques terroristas do 11 de Setembro mostraram as primeiras fissuras desse cenário utópico. Dez anos já passaram, o que seria tempo suficiente para que a pujança norte-americana voltasse a se restabelecer sem maiores dificuldades. Mas a crise de 2008 eclodiu e nem o grande surto de esperança causado pela chegada de Barack Obama ao poder conseguiu desfazer um cenário de pessimismo, desemprego, aumento da pobreza, endividamento, conservadorismo exacerbado, instabilidade política e radicalização ideológica. Além de ver o modelo neoliberal questionado por todos os lados e observar o crescimento exponencial da China para tornar-se, em médio prazo, uma potência econômica, política e militar de mesmo ou maior porte.
É sob esse quadro que o advogado Durval de Noronha Goyos reúne uma série de artigos entre 2009 e 2011, publicados especialmente no Jornal do Brasil e no site Última Instância – e republicados em mais de vinte veículos –, no livro O Crepúsculo do Império e a Aurora da China (Editora Observador Legal, 272 págs.). Primeiro brasileiro – e latino – abrir um escritório de representação comercial na China, ele acompanha de perto a ascensão do dragão chinês desde quando assessorou o ingresso do país asiático na OMC (Organização Mundial do Comércio).
Na primeira parte do livro, Noronha destrincha a crise vivida pelos EUA logo após a explosão da bolha hipotecária ao fim de 2008, que acabou por se espalhou um todo o mundo. Para ele, o declínio dos EUA se deve em parte ao seu modelo econômico idealizado no capital financeiro, outrora responsável pelo protagonismo do país.
Noronha defende a substituição do dólar por uma nova moeda de reserva internacional e um modelo econômico global sólido, distante do domínio dos mercados e baseada na economia real. Também critica veemente os excessivos gastos norte-americanos com despesas militares.
Por outro lado, destaca a mudança de rumos na China sob a tutela de Deng Xiaoping desde 1977. Ao decidir-se não mais copiar o modelo soviético e a tratar o socialismo como um modelo evolutivo, e não alternativo ao capitalismo, os chineses tornaram-se em pouco mais de vinte anos o mais importante país do mundo para os EUA em termos estratégicos.
Em um dos artigos emblemáticos dessa contraposição, ele lembra que a China atingiu um superávit comercial recorde com os Estados Unidos no valor de 181,3 bilhões de dólares e um aumento de 34% de seu comércio exterior. Por outro lado, os norte-americanos transferiram sua indústria de consumo para os asiáticos, não vendem para eles armamentos nem produtos de tecnologia sensível.
Em outro texto, também destaca a retirada das reservas chinesas dos títulos de Tesouro dos EUA. Tudo em razão da clara percepção por parte dos chineses sobre a importância cada vez menor do dólar, seja pelos fundamentos fracos da economia dos EUA quanto pela ascensão de outros países em desenvolvimento.
Em sua opinião, a emergência da China como a maior potência econômica mundial, em contraste à decadência do poderio norte-americano, será um dos fatos marcantes do século XXI.
Além da comparação sino-norte-americana, Noronha também dedica uma segunda parte da publicação, outros 29 artigos, sobre direito e diplomacia. Além de dedicar novamente muitos pensamentos à China também trata de temas espinhosos como o caso Cesare Battisti, o interminável conflito Israel x Palestina, as limitações do Mercosul, a relação do Itamaraty com o Irã e a postura do governo brasileiro ministério no caso da deposição do ex-presidente hondurenho Manuel Zelaya – a qual ele critica.
Destaque para “O Objetivo Central da Diplomacia Chinesa”, publicado originalmente em setembro de 2011, ele aborda o “livro branco”, que traça as diretrizes da política externa chinesa: interdependência e progresso mútuo com os outros países, contra o modelo de hegemonia praticado pelas nações imperialistas.
Texto de João Novaes para o site Opera Mundi.