A Itália elege o abismo: vence a direita radical

Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 16 de abril de 2008.

Verona – O eleitorado italiano optou pela coalizão de direita radical nas eleições parlamentares de domingo e segunda-feira próximos passados, que obteve uma maioria expressiva em ambas as casas do parlamento italiano, com cerca de 46 % na Câmara dos Deputados e 47% no Senado. O voto, ao qual compareceram cerca de 80% dos eleitores, deu-se pelo tradicional sistema manual.

A coalizão de direita radical é liderada por Silvio Berlusconi, de 72 anos, que terá o seu terceiro mandato como primeiro-ministro italiano. Os dois anteriores foram um grande fracasso. Dentre seus principais aliados tradicionais estão o neofacista, Gianfranco Fini, e o xenófobo separatista, Umberto Bossi, da Lega Nord.

As forças de centro-esquerda, reunidas num só partido, pela primeira vez na história republicana da Itália, o Partido Democrático, liderado por Walter Veltroni, com o seu aliado, o Itália dei Valori, de Antoni di Pietro, ex-membro do ministério público responsável pela chamada operação das mãos limpas, obteve cerca de 38% da Câmara e Senado.

Por sua vez, os comunistas da anterior Rifundazione Comunista, liderados por Fausto Bertinotti e reagrupados na chamada Esquerda Arco-íris, não obtiveram o patamar mínimo de votos de 4%, necessário para a representação parlamentar.

Pela primeira ocasião na história republicana da Itália, o parlamento não terá nenhum representante comunista. Fausto Bertinotti, último presidente da Câmara, perdeu assim o seu mandato. Da mesma forma, os pequenos partidos deixaram de ter representação parlamentar, o que resultou numa maior concentração política, também situação singular.

A opção feita pelo eleitorado italiano não deixa de despertar as mais profundas preocupações pelo futuro do país, especialmente no período dos cinco anos em que durará o mandato popular ora obtido nas urnas pela direita radical de Silvio Berlusconi. De fato, o país encontra-se estagnado numa economia que, em 2008, não deverá crescer mais do que 0.3%. Acresce que a Itália tem o maior déficit público da UE (União Européia) num patamar superior ao permitido pelas normas do Tratado de Maastrich, apesar de ter uma das maiores cargas tributárias, e de evasão fiscal, do bloco regional de comércio, o que reduz a margem de possibilidade de investimentos públicos.

De mais a mais, a burocracia italiana é uma máquina pesada e impiedosa, dificultando a atividade tanto empresarial como o dia a dia da população. A legislação italiana é arcana e as medidas de facilitação empresarial na área societária, regulatória, tributária e trabalhista praticamente inexistem.

A classe média e o operariado se sentem pressionados pela inflação, pela falta de oportunidades e pela desesperança de viver num país que não funciona. Tais vicissitudes tornam o terreno fértil para o crescimento de ideologias populistas, xenófobas e oportunistas como as apresentadas pela Casa della Libertà, coalizão de Silvio Berlusconi.

Seria difícil imaginar-se um pior líder para um país que necessita de se reformar urgentemente, como a Itália, do que Silvio Berlusconi, um político que, com Bush e Blair, é responsável por crimes de guerra no Iraque, que responde perante o Judiciário por crimes de corrupção, que tem conflito de interesses com o Estado, na gestão do seu império mediático, e que, além de tudo, não apresenta propostas credíveis.

Mais ainda, sua base de apoio é preocupante. Bossi, a negação de Garibaldi, é um xenófobo líder de uma súcia de rufiões, que evoca os piores momentos da história centro-européia. Fini é, por sua vez, o herdeiro de Mussolini. Que renovação poderão tais homens políticos trazer à Itália?

Para nós no Brasil, pátria de cerca de 40 milhões de descendentes de italianos, tal situação é triste e penosa. Devemos estar prontos para, uma vez mais, acolhermos, em nosso território, os desesperançados da Itália.