Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 26 de julho de 2006.
São Paulo – Formalizou-se a adesão da Venezuela como membro pleno do Mercado Comum do Sul, o Mercosul, por ocasião da 30ª Reunião Ordinária de presidentes do bloco. A efeméride é certamente um importante marco na história do Mercosul, por representar uma expansão orgânica, por agregar uma economia de grande relevo ao bloco, e por propiciar meios mais eficazes de colaboração política com um ator de grande expressão regional.
Alguns críticos conservadores, com o característico oportunismo, procuraram minimizar o acontecimento tratando-o como o desvirtuamento dos princípios do Mercosul, que estaria se tornando ideológico ou político. Procuram assim atacar a política externa da administração do Presidente Lula.
Ora, acima dos objetivos econômicos do bloco, sempre estiveram as intenções políticas, desde a assinatura do Tratado de Assunção, em 1991, época em se dava a redemocratização dos Estados da América do Sul, depois de tenebrosos tempos ditatoriais. Durante toda a existência do Mercosul, até hoje, as considerações políticas estiveram bem acima daquelas de ordem econômica.
Os exemplos abundam. Vão eles desde a vastíssima lista de exceções à TEC; à existência de um regime “draw-back” para exportações intra-bloco; à inexistência de um sistema eficaz de resolução de disputas, que compromete a juridicidade do regime legal do bloco; às falhas no regime de regras de origem; à falta de uniformização legislativa em campos como o direito do consumidor e ambiental; à tutela governamental dos interesses privados, forçando acordos estranhos aos interesses da livre iniciativa, etc.
As disparidades econômicas existentes no bloco induzem, em parte, concessões do lado do Brasil, de maneira a propiciar um crescimento econômico razoável nos parceiros. Por outro lado, as disparidades geográficas, no lado populacional, impedem um adensamento das instituições jurídicas e democráticas do Mercosul.
Isso ocorre porque o desequilíbrio populacional em favor do Brasil resultaria ou num bloco com instituições controladas por nosso país, ou em instituições que consagrariam uma odiosa violação do princípio da representatividade democrática, em que o Brasil seria minoritário.
Assim, a administração das relações intra-bloco tem sido políticas, mas conduzida numa base “ad-hoc”, em caráter não institucional. E deverá assim continuar no futuro de médio prazo. A acessão da Venezuela ao bloco representa uma minoração das disparidades acima mencionadas e, desta maneira, dão um alento à superação dos problemas delas decorrentes.
De mais a mais, a Venezuela tem uma economia vibrante, fundada na matriz energética, notadamente o petróleo, e oferece importantes oportunidades para os agentes da economia privada brasileira, no mercado interno daquele país, para acesso de uma gama ampla e variada de produtos, com tarifa zero.
Por sua vez, a Tarifa Externa Comum, a TEC, irá onerar os produtos extra-bloco e assim dará uma margem de preferência às mercadorias brasileiras. Nossos serviços serão igualmente beneficiados.
Por outro lado, espera-se que a colaboração da Venezuela com os outros países membros do MERCOSUL no âmbito da política externa resulte em ações concretas fundadas no equilíbrio, na ponderação, na competência, e bem assim na intransigente defesa dos interesses dos povos dos respectivos Estados, nos foros internacionais.
Da mesma maneira, é de se esperar que a acessão da Venezuela ao bloco reforce os fundamentos do estado de Direito e da democracia naquele país, como de resto na região. A adesão da Venezuela ao bloco traz ainda um incentivo para que os demais países da América do Sul pleiteiem, igualmente, sua acessão, o que certamente trará benefícios importantes a todos.