Publicado na versão eletrônica no sítio do JB On Line (http:\\www.jbonline.com.br), bem como na versão impressa no Jornal do Brasil, caderno Economia & Negócios, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 20 de dezembro de 2009.
O chamado Consenso de Washington, hoje em total descrédito, foi um receituário espúrio patrocinado pelos organismos multilaterais com o fim de melhor permitir o eficiente saque das economias dos países em desenvolvimento pelos estados hegemônicos. As medidas recomendadas foram todas adotadas, ao menos até certo ponto, pela administração de Fernando Henrique Cardoso. Dessas, duas em especial tiveram continuidade no governo Lula: as políticas de juros e de câmbio.
Rezava a cartilha neoliberal do Consenso que as taxas de juros deveriam ser altas para remunerar abundantemente o capital, juntamente com a liberalização cambial, para permitir o livre fluxo internacional de divisas, num regime de câmbio flutuante. Ocorre que a elevação das taxas de juros não apenas tem o efeito de desestimular os investimentos produtivos, mas induz uma apreciação das taxas de câmbio, o que facilita o acesso das importações.
Dessa maneira, ganham os senhores dos setores hegemônicos do estrangeiro com um subsídio às inversas, porque desembolsado pelos brasileiros, para a importação de seus produtos pelo Brasil. Ganham ainda com as operações de especulação de câmbio e arbitragem de taxas de juros no Brasil e lucram da mesma forma com a altíssima remuneração do capital.
De maneira a permitir esses ganhos para os interesses espúrios estrangeiros, o Brasil sacrifica a competitividade tanto internacional quanto doméstica de seus produtos, a capacidade de investimentos produtivos no país, a própria existência da indústria nacional e de diversos de seus setores produtivos e permite uma situação artificial e estéril em seus mercados de capitais.
A manutenção de tal melíflua política pelo governo Lula está já a mostrar evidentes sinais de sua natureza desastrosa para os interesses nacionais, já que de seus efeitos danosos irão decorrer conseqüências estratégicas muito graves de natureza macroeconômica como um sério déficit no balanço de pagamentos numa economia sem atividade produtiva doméstica, de dependente das importações. Uma situação insustentável.
De fato, o efeito do câmbio disparatado atingiu as raias do insano.
A carne brasileira, produto onde tradicionalmente temos a maior competitividade mundial, passou a ser a mais cara do mundo com a majoração do preço de US$ 22 para US$ 45 a arroba. O espumante brasileiro custa três vezes mais o preço do importado da Itália. A geléia de frutas aqui fabricada custa o mesmo preço das mais caras da França, etc. Os exemplos abundam e são de uma evidência solar.
Pelo efeito das distorções cambiais, as tarifas brasileiras perderam o propósito de proteção legítima e legal da economia doméstica, como assegurado pelo regime jurídico multilateral da Organização Mundial do Comércio (OMC), já que a majoração artificial cambial praticada no País supera de muito os nossos impostos de importação.
Por sua vez, à guisa de comparação, a República Popular da China nunca adotou o Consenso, razão pela qual é a locomotiva da economia mundial e seu crescimento, mesmo num ano de crise como foi 2009, será de 8%. Seu câmbio administrado assegura o crescimento da indústria doméstica ao promover a maior competitividade internacional de seus produtos.
O saldo comercial da China é 10 vezes superior ao do Brasil e o seu balanço de pagamentos é superavitário em US$ 364 bilhões, enquanto que o do Brasil, já é nesta altura, deficitário em US$ 19 bilhões.
Seus produtos têm crescente acesso no mercado internacional e, em especial, no Brasil, onde são injustamente atacados por medidas de defesa comercial insubsistentes, à falta da correção do problema estrutural da economia brasileira.
Acresce que as regras chinesas de fluxo financeiro de 2008 não permitem o fluxo de capital especulativo, o que direciona os investimentos para o setor produtivo.
Suas baixas taxas de juros reforçam o ritmo dos investimentos, que chega a ser aproximadamente três vezes mais daquele encontrado no Brasil, em percentual do Produto Interno Bruto (PIB). Enquanto isso, as reservas internacionais da China atingem o montante do equivalente a US$ 3 trilhões.
No Brasil, os insaciáveis lobistas do setor financeiro, exclusivamente tão interessados no próprio lucro quanto insensíveis ao progresso da Nação, propagam a falácia de que o custo de manutenção das reservas brasileiras, no montante de US$ 240 bilhões, seria de 0.8% do PIB nacional.
Qual seria então o custo chinês? O governo Lula será julgado pela História não pelos aduladores do momento nem mesmo pelos especuladores, mas sim pela sóbria análise do legado de suas políticas no crescimento econômico e desenvolvimento social do País no foro da opinião pública. O câmbio e taxas de juros do Consenso de Washington provavelmente assegurarão o juízo negativo.