Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 07 de setembro de 2005.
São Paulo – No ano passado, nesta coluna, examinei em “O fim do Acordo Multifibras e o Futuro do Setor Têxtil” a questão da liberalização do comércio setorial após a liberalização havida a partir de 1º de janeiro de 2005, com o fim das quotas. Naquele artigo, já apontei a tendência de um novo comércio administrado na área, em função da maior competitividade relativa da indústria chinesa.
De fato, já no dia 8 de abril de 2005, a UE (União Européia), através seu comissário de Comércio, o Sr. Peter Mendelson, já solicitava à China a restrição voluntária de suas exportações têxteis para aquele bloco comercial, em função de um massivo surto de importações ocorrido a partir do início deste ano. O referido surto ameaçava causar um enorme dano à indústria doméstica européia, com grandes perdas de postos de emprego, o que levou aquela união alfandegária a iniciar um processo de investigação no âmbito da defesa comercial, no dia 24 de abril.
Menos de um mês após, em 17 de maio, a UE transformou a sua solicitação anterior numa ameaça de sanções, caso a China não reduzisse imediatamente suas exportações. Três dias após, a China aumentou drasticamente os seus impostos de exportação sobre 74 categorias de produtos têxteis com o objetivo de diminuir a competitividade de sua indústria e, assim, reduzir as exportações para a UE e para os EUA (Estados Unidos da América).
Como a última medida não foi suficiente para afastar a ameaça de introdução de quotas por parte dos EUA e da UE, a China anunciou o seu cancelamento no dia 30 de maio próximo passado. China e UE entraram imediatamente em tratativas e, no dia 19 de junho, acordaram em limitar o crescimento das exportações chinesas em aproximadamente 10% por ano, até 2008.
Contudo, já no dia 22 de agosto, nada menos do que oito categorias de produtos têxteis já haviam excedido as quotas anuais para o ano de 2005, o que resultou no bloqueio nas alfândegas européias, dos itens a mais, que compreendiam cerca de 48 milhões de blusas e 17 milhões de calças, dentre outros. As autoridades européias ficaram então sob pressão dupla: de um lado, estavam os industriais têxteis, a apoiar o bloqueio e, de outro, ficaram os varejistas, que contavam com a mercadoria para colocar no comércio.
Na segunda-feira (5/9), os chineses e europeus chegaram a um acordo mediante o qual metade do excedente à quota anual de 2005 seria acrescentada ao permitido, ao passo que a outra metade seria incorporada à quota de 2006. Dessa maneira, ficou satisfeito o Comissário Mendelson, por ter acendido uma vela ao santo e outra ao capeta, numa solução acomodatícia de curto prazo. Por outro lado, ficaram satisfeitos os chineses porque evitaram, através das negociações, as medidas unilaterais tão a gosto dos políticos e empresários dos EUA.
Insatisfeitos ficarão os industriais têxteis europeus pela reduzida margem de proteção dada, o que nos leva a prognosticar uma altamente provável retomada das tensões no setor num futuro próximo.
Como resultado, os chineses terão um paradigma favorável de curto prazo para negociações têxteis com outros países, inclusive com o Brasil.