A distorção da educação

Publicado no jornal Diário da Região, São José do Rio Preto, SP, 25 de setembro de 2024.

Nos festejos da data nacional brasileira, vi desfilarem crianças fantasiadas de militares, o
que me causou espanto e ojeriza por evocar momentos dramáticos da História. De fato, as
crianças com uniformes castrenses lembraram-me daquelas infelizes sob os regimes
fascista e nazista, os membros da Opera Nazionale Balilla e da Juventude Hitlerista. Os
ditadores Benito Mussolini e Adolf Hitler usaram programas de educação pública
subvertidos para o fim de sustentação de seus regimes espúrios, na Itália e Alemanha,
promovendo políticas de repressão interna e de agressão externa, a partir de 1922.

Tais ações, iniciadas então naqueles países, tiveram desastrosos resultados para os seus
povos, para além da responsabilidade por dezenas de milhões de mortos mundo afora,
inclusive no Brasil. Sob o manto falacioso de oferecer uma educação integral higiênica,
psicológica, social, moral e cívica, os ditadores na realidade formavam milícias para a
opressão no âmbito interno e soldados para as agressões imperialistas no exterior. A
militarização começou a partir de 1930, quando foram utilizados quadros no império
colonial italiano na África e na Ásia, e se intensificaram com o início da 2ª Guerra Mundial,
em 1939.

No final do conflito, na Alemanha, em meados da década de 1940, os nazistas utilizaram
em suas tropas jovens de 12 a 16 anos de idade. Estas crianças e adolescentes foram
egressas de escolas de educação militar, moldadas por um Estado autoritário, que passou a
controlar todos os setores formadores da personalidade e da opinião. Os líderes
nazifascistas tinham a convicção de que, através dos jovens e crianças, poderiam atingir o
comportamento e o imaginário de toda a população. Os pequenos soldados do fascismo
seriam transformados no “novo homem”, um cidadão integrado ao sistema.

Na Alemanha hitlerista, o objetivo da formação educacional foi assegurar um sentimento
nazista para as futuras gerações mediante propaganda com informações falsas. Nas suas
“academias”, os jovens foram doutrinados nos conceitos raciais e nas teorias do ódio.
Ademais, a formação visava substituir a tradicional cultura alemã pelos subvalores
nazistas e por preconceitos, como os da pretensa superioridade racial. Os soldados delas
egressos seriam motivados às suas funções, como o extermínio das raças julgadas
inferiores.

Na Itália, a inscrição obrigatória na Opera Balilla foi introduzida gradualmente e
encontrou terreno fértil na vida dos jovens, submetidos a lavagem cerebral, ao
cerceamento de informações e desestímulo à reflexão alternativa àquela apresentada pelo
Partido Nacional Fascista. Mesmo as organizações católicas foram reprimidas! O
juramento do Balilla dizia “Em nome de Deus e da Itália, juro seguir as ordens do Duce e
servir à causa da Revolução Fascista”. O Manual do Balilla afirmava: “o Duce tem sempre
razão”.

Os jovens sobreviventes de tal sandice viram o mundo em chamas, os seus países
destruídos, seus pais mortos ou encarcerados, suas mães famintas e irmãs prostituídas.
Este foi o fim do “novo homem” nazifascista! Penso que, atualmente com maior razão, a
educação militar deva se restringir aos objetivos específicos das Forças Armadas,
conforme a Constituição. A subordinação da educação pública aos supostos valores
militares ofereceria a oportunidade de, mais do que a promoção da mediocridade, ampliar
o controle social pelos poderosos, para fins espúrios, dentre os quais a destruição da
ordem democrática e do livre pensamento.

DURVAL DE NORONHA GOYOS JR., Jurista, escritor e historiador Escreve
quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras