A luta pela democracia no Congo

Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 6 de agosto de 2007.

São José do Rio Preto – Há na história do Congo muito em comum com aquela dos demais países da África, notadamente na brutal exploração a que foram submetidos os respectivos povos pelos colonizadores europeus. No caso do Congo, os territórios existentes foram submetidos aos poderes coloniais da França, o Congo Francês, hoje República do Congo; aos da Bélgica, hoje República Democrática do Congo; e aos de Portugal, hoje o enclave de Kabinda da República Popular de Angola.

Trato aqui hoje dos desafios à sedimentação da democracia na RDC (República Democrática do Congo) que, com capital em Kinshasa, possui um dos maiores territórios dentre os países africanos. A RDC obteve sua independência da Bélgica em 1960, após uma das mais brutais ocupações coloniais de que se tem notícia.

Poucos podem hoje imaginar o povo belga capaz de cometer os crimes registrados na ocasião e, lamentavelmente, muito se faz hoje para que tal passado seja convenientemente esquecido. Todavia, não se pode examinar os desafios presentes da RDC sem se levar em consideração o criminoso passado colonial.

Com a independência da RDC, denominada na década de 70 como Zaire, desencadeou-se uma intensa guerra civil, que exigiu a primeira e única legítima deslocação de tropas de combate pela ONU (Organização das Nações Unidas), que não teve sucesso na pacificação completa do país e na construção de instituições políticas sólidas e confiáveis.

Posteriormente, a RDC sofreu duas violentas guerras civis, a primeira em 1997 e a segunda de 1998 a 2003, conflitos que tiveram um número de vítimas fatais somente inferior àquele verificado na Segunda Guerra Mundial. Na ocasião, verificaram-se os massacres de etnias habitantes do leste do país, quando morreram mais de 800 mil pessoas, segundo dados da ONU.

Em novembro de 2006, após a promulgação de uma nova constituição, realizaram-se, pela primeira vez desde a independência do país, eleições democráticas acompanhadas por observadores internacionais. Resultou eleito Joseph Kabila, com 58% dos votos válidos, com um mandato de 5 anos.

Os desafios para a administração Kabila são enormes, a começar pelas dúvidas decorrentes do relacionamento com a oposição e particularmente com a aceitação, por esta, do jogo democrático. Em seguida, a situação no leste do país continua altamente instável, com violência sistêmica. Há quase 20 mil soldados da ONU em missão no país, a um custo de US$ 1 bilhão por ano.

Por último, a situação econômica permanece difícil, Muitos dos conflitos regionais têm origem no interesse econômico estrangeiro na exploração das riquezas do país. De mais a mais, 55% do PIB da RDC depende da agricultura, o setor que mais sofre com os subsídios predatórios praticados pelos países desenvolvidos, notadamente na área do algodão e do açúcar.

Para que a RDC possa superar o quadro de imensas dificuldades que se apresenta, faz-se fundamental a continuidade do apoio da comunidade internacional. O mundo deve muito ao povo do Congo.