Banco Central do Brasil concentra investimentos em porcaria: o dólar americano

Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 27 de julho de 2011.

São Paulo – A notória fragilidade da economia dos Estados Unidos da América teve mais um realce recente com o atual impasse para a aprovação, pelo Poder Legislativo daquele país, da majoração do teto de endividamento nacional, hoje situado na casa dos US$ 14,3 trilhões, valor equivalente ao Produto Interno Bruto.

Enquanto até mesmo as agências ocidentais de avaliação de crédito, com estreitas ligações com os meios financeiros norte-americanos, ameaçam rebaixar a qualificação de risco dos EUA, o que já foi feito, por sinal, desde o ano passado pela agência Chinesa Dagong Global Ratings Co. Ltd., investidores fogem do dólar, da bolsa americana e dos títulos do governo do país.

O mesmo ocorre com os países soberanos. Muito atento, o Banco do Povo, da República Popular da China, que administra as maiores reservas soberanas do mundo, hoje em valor aproximado de US$ 3,3 trilhões, tem gradualmente migrado de valores denominados em dólares para outras moedas e ativos representativos de mercadorias.

Hoje, apenas US$ 1,1 trilhão das reservas chinesas estão aplicadas em títulos do tesouro americano, ou um terço do total. No passado não muito distante, a referida proporção era superior a dois terços.

No entanto, o Banco Central do Brasil tem ainda uma alta concentração em títulos denominados em dólares norte americanos. De fato, do total de reservas brasileiras, em valor aproximado de US$ 330 bilhões, cerca de US$ 230 bilhões estão aplicados em títulos do tesouro americano, ou mais de dois terços.

O Brasil tornou-se o quarto maior investidor nos títulos do tesouro americano, atrás da China, do Japão e da Inglaterra mas, excluído este último que tem fortes ligações de mercado com os EUA, o país com maior concentração percentual de suas reservas naqueles ativos.

A formação de enormes reservas brasileiras decorre principalmente de anomalias na política monetária brasileira no tocante à prática de excessivas taxas de juros, à facilitação na atração de capitais especulativos para os mercados de capitais brasileiros e à permissividade inconsequente no uso de derivativos cambiais sem lastro.

Assim, para evitar a valorização dramática da moeda brasileira, com a consequente ruína total da indústria brasileira, o Banco Central do Brasil é levado a adquirir o dólar americano e, em seguida, compra ativos denominados naquela divisa, ao invés de diversificar em maior grau as suas aplicações como faz a China.

Dessa maneira, a política monetária brasileira, que levou o Real a ser cotado a R$1,53 em 26 de julho de 2011, ou o menor patamar desde 1999, não apenas está a arruinar a economia brasileira, mas está aplicar nossas reservas preponderantemente em títulos de alta volatilidade, baixo valor intrínseco e de alto risco.

Quando das inúmeras crises de liquidez do Brasil nas décadas de 70 e 80, o governo americano não aplicava diretamente em títulos brasileiros, mas preferia que as inversões fossem feitas através de organismos multilaterais, como o infame Fundo Monetário Internacional.

Procediam dessa forma as autoridades monetárias dos EUA sob o argumento ponderável do zelo na gestão da coisa pública, critério que obviamente não é levado em conta pelos componentes da diretoria do Banco Central do Brasil.

Não seria o caso de fazermos o mesmo, recomendando aos norte-americanos o recurso ao FMI, com a adoção de suas receitas de austeridade, e migrarmos nossos investimentos para ativos com alguma substância?