Artigo publicado no sítio eletrônico diariodaregiao.com.br, São José do Rio Preto, SP, 21 de junho de 2017.
Depois de 59 livros sobre direito, economia, relações internacionais, história e linguística, Durval de Noronha Goyos Jr., presidente da União Brasileira de Escritores (UBE), passou a escrever contos, com o heterônimo António Paixão. Dos contos, o advogado rio-pretense foi além, e adotou o mesmo heterônimo em seu primeiro romance, Shanghai Lilly, de maneira a não confundir o gênero literário com suas obras anteriores.
Publicado pela Chiado Editora, de Portugal, o livro foi lançado em São Paulo, na sede da UBE, e em Lisboa. Em Rio Preto, o lançamento é nesta quinta-feira, 22, a partir das 19h30, no lounge da Starbucks, do Riopreto Shopping. A obra tem 332 páginas e custa R$ 39.
Goyos Jr. descreve António Paixão como um jornalista carioca, torcedor do Botafogo e do Corinthians, frequentemente desempregado e amante dos bons vinhos. “Com uma vasta cultura, António Paixão é um incompreendido e levado a escrever obras para terceiros, como pena de aluguel, diria ele, que ademais odeia anglicismos em geral e a expressão ‘ghost writer’ mais ainda. Mas foi nessa capacidade que Paixão foi contratado pela milionária Vivian Salomon, para escrever sua autobiografia, ideia que lhe deu seu psiquiatra argentino de Miami.”
Shanghai Lilly seria portanto a biografia autorizada de Vivian Salomon, uma mentirosa compulsiva, na definição de Goyos Jr., a ponto de declarar que optou nesta obra por dizer o oposto da verdade, mas sempre com muita sinceridade e grande precisão.
No livro, escrito em primeira pessoa, o leitor vai deparar com a história de vida de Vivian, na qual, segundo ela, serão admiradas as suas muitas qualidades pessoais, como beleza, esperteza, argúcia, candura, honestidade moral, pureza de pensamentos, lealdade, sinceridade e práticas sexuais heterodoxas, sem falar da modéstia. No desenrolar do texto pode-se verificar o embate entre Paixão e Vivian, em questões de forma e estilística.
O título, Shanghai Lilly, foi inspirado na cortesã interpretada por Marlene Dietrich no filme O Expresso de Xangai, de 1932. “Porque foi este o ‘nom de guerre’ escolhido por Vivian Salomon quando tirou uma licença sabática para se purificar como profissional do sexo num prostíbulo de Xangai, experiência que é retratada na obra”, explica Goyos Jr.
Além de criar um heterônimo, o rio-pretense optou por escrever, segundo ele, com voz feminina. “Devo dizer que me senti totalmente à vontade para escrever como mulher, pois, aos 66 anos de idade, com minha experiência de mais de 40 como advogado, representando os mais diversos clientes de múltiplas nacionalidades, sinto-me confortável até mesmo para redigir na qualidade de extraterrestre. Assim, o que para outros pode parecer uma aventura fora de minha zona de conforto, para mim foi bastante natural.”
Em Shanghai Lilly, Goyos adota até “emoticons” nos textos. “Porque a linguagem da fútil Vivian é baseada nas formas das redes sociais. Muito embora ela tenha permitido ao Paixão escrever em português erudito, ela não abriu mão dos emoticons, que complementaram um rico vocabulário de cerca de 15 mil léxicos diversos. Note-se que um americano médio tem um vocabulário de cinco mil palavras.”
Goyos Jr. conta que a recepção da obra pela crítica tem sido muito boa, após o lançamento em São Paulo e Lisboa. “O grande poeta brasileiro Cláudio Willer, premiado internacionalmente, comentou ‘apreciei a exuberante sátira de seu debochado heterônimo António Paixão. Aliás, heterônimo mesmo, e não apenas pseudônimo. Irreverente, fluente, além de muito informativo.’”
Ricardo Ramos Filho, neto de Graciliano e um dos principais escritores de literatura infantil, disse, segundo Goyos Jr., que Shanghai Lilly faz parte do seleto grupo de obras que merecem ser trilhadas. “Por sua vez, Levi Ferrari, crítico literário, escreveu que ‘não pense o leitor que Shanghai Lilly, apesar do que ensina, é obra didática. O autor mantém o bom humor do começo ao fim do livro. Seu mergulho no âmago de relações humanas complexas, densas, onde não faltam boas pitadas de erotismo; ou, as observações econômicas, culturas e políticas, em nada comprometem o prazer da leitura’.”
Trecho do livro
– “E então, Alberto, como fica minha vida sexual?” Parecia que Alberto-aquele-escroque já esperava minha resposta e disparou da cintura, como um pistoleiro vigilante da periferia de Osasco: – “Como a vida sexual das demais pessoas normais. Você deve reduzir substancialmente o número de parceiros sexuais. Melhor: você deve arrumar um namorado fixo, que dure por algum tempo. Se não der certo, você arranja outro. Não será nada difícil. No ínterim, seja fiel. Se sobrar algum tempo, vá aprender francês, língua fácil por se nada mais que um mero italiano degenerado. Ademais, cada nova língua aprendida expande nosso universo cultural.” Não acreditei que o Alberto-aquele-galinha-do-cacete estivesse me dando mais uma lição de moral. A segunda em poucos minutos! Primeiramente, me chamou de anormal e, depois, queria que eu fosse monogâmica e ainda fiel. Não bastasse isso, mandou-me que trocasse o sexo pelo idioma francês! Que barbaridade! (…) (pág. 111)