Texto publicado no jornal “Jornalista e Cia”, por Albino Castro, Lisboa, setembro de 2021.
Durval de Noronha Goyos, com o heterônimo de António Paixão, lançou o memorável Annus Horribilis 2020 – saudado inclusive em Lisboa, na celebrada Feira do Livro de 2021, inaugurada no último dia 26 de agosto. Meu caríssimo amigo, Durval, como Fernando Pessoa, é um mestre dos heterônimos.
Aos 68 anos, paulista de São José do Rio Preto, descende, por parte do pai, de nobre família lusitana vinculada aos cruzados hospitalários do Crato, ao Norte de Portugal, e, pela mãe, italianíssimo – e cujo avô, um de seus inspiradores, bateu-se contra o nazifascismo no Bel Paeseu António Paixão, embora seja um personagem de São Paulo, é, a rigor, um clássico jornalista dos anos dourados do Rio de Janeiro, que mescla com rara desenvoltura um bom trago com posturas esquerdistas − como Millôr Fernandes (1923-2012), carioca do Meyer, criador do Pif-Paf; o genial Sergio Porto (1923-1968), carioca de Copacabana, que usava o pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta; ou o apaixonado Fausto Wolff (1940-2008), meu querido e saudoso sogro, pai de dona Andrea Wolffenbüttel, gaúcho de Santo Ângelo, mas carioquíssimo da gema e um dos fundadores do semanário O Pasquim. O personagem de Noronha Goyos, jornalista boêmio e desempregado por opção, é uma mistura de todos os velhos e rebeldes homens de imprensa da época na qual as composições dos textos eram feitas a chumbo, em pesadas máquinas Linotype, os linotipos, e as fotos reproduzidas em clichês de zinco.
Annus Horribilis é uma obra de autor ficcional, entretanto, com crônicas verdadeiras do cotidiano brasileiro nestes quase dois anos de pandemia. “É um livro de combate”, afirma, no prefácio, o poeta e jornalista Adalberto Monteiro, curador da prestigiosa Fundação Maurício Grabois e membro da Direção Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), aliás, como António Paixão. Noronha Goyos cultiva, como Pessoa, diversos heterônimos valiosos, entre os quais, o Napolitano Beppe Molisano, morador do paulistano bairro do Bom Retiro; o poeta inglês Tony Malvern, mercenário da pena, que vive no Reino Unido, porém seu principal cliente é um irlandês; e o chinês Yuese Fajing, professor de Economia na Universidade de Pequim. Annus Horribilis 2020 é um título inesquecível e a obra merece ser desfrutada.
Por Albino Castro