O Equador, a mais recente vítima do FMI

Publicado na Coluna Semanal do Dr. Noronha a convite do sítio “Última Instância – Revista Jurídica”, São Paulo, Brasil, 04 de maio de 2005.

PORTO ALEGRE (RS) – Enquanto uma diretora do FMI (Fundo Monetário Internacional) proferia, no Brasil, disparates públicos a respeito da situação da política econômica brasileira, em flagrante confronto com a realidade, e em violação aos mais básicos princípios éticos profissionais, o governo democrático equatoriano sucumbia sob o peso das políticas inspiradas por aquele organismo multilateral.

A mesma falta de governança que leva um funcionário de um organismo internacional a fazer comentários públicos impertinentes a respeito da situação de risco de um Estado membro cliente daquela entidade permitiu, numa escala muito pior, que o FMI se tornasse um aríete da política externa norte-americana. É apenas mais um caso de desvio de finalidades de um organismo multilateral.

Assim, não é de surpreender que tais declarações tivessem sido formuladas imediatamente antes da visita da secretária de Estado dos Estados Unidos da América a Brasília. De fato, é sabido que, com os mercados nervosos a respeito da economia de um país, a diplomacia americana é mais eficaz. Trata-se de expediente bastante conhecido: desestabilizar para vender sua influência por concessões que, de outro modo, não seriam feitas. Já denominei essa prática de corrupção institucional nessa coluna.

O caso do Equador, desgraçadamente para o seu povo, é muito mais grave. O interesse dos EUA por aquele país é fundado em dois fatores básicos: a) a importação de petróleo existente em abundância no Equador; e b) a base militar de Manta, cedida aos norte-americanos como centro de suas operações na Amazônia.

Fundado em tais interesses estratégicos de seu grande senhor, o FMI instou o Equador a adotar o dólar norte-americano como sua moeda, já como o fizera, com desastrosos resultados, na Argentina. De fato, não há maneira mais eficaz de dominar um país do que sua adoção da moeda de emissão da parte hegemônica.

Como resultado, o Estado cliente perde a capacidade de gerir a própria política monetária. Perde, assim, também a condição de promover o desenvolvimento com justiça social e majoração da renda individual. Tal é tanto mais grave no Equador, um país com cerca de 70% da população composta de índios vivendo na situação de parias, conforme observou corretamente o renomado professor brasileiro Luiz Alberto Moniz Bandeira com o seu costumeiro rigor científico, em artigo recente.

A situação de fragilidade econômica é, de mais a mais, agravada pelo fato de que a indústria do petróleo, de um modo geral, e mais grandemente quando em mãos de multinacionais, é excludente quanto à repercussão social de seus ganhos. Esses efeitos são mais sentidos quando, como no caso do Equador, o petróleo é exportado ao invés de ser utilizado para a geração de riquezas locais. O fenômeno, de resto, é bastante conhecido no Oriente Médio, onde a indústria do petróleo, há quase um século, tem trazido a exclusão social, guerras e a sanguinária ocupação estrangeira.

Assim, desde a adoção do dólar como moeda nacional pelo Equador, no ano 2000, dois presidentes eleitos já foram destituídos, a democracia encontra-se comprometida, o Estado de direito solapado e a desesperança agrava-se na alma do sofrido povo equatoriano, que vive sem perspectivas de um futuro melhor.

Viva para o FMI e para o seu patrão!